Teorias físicas sempre estiveram muito presentes no cinema - principalmente em filmes de sci-fi. E claro que, os HQs da Marvel usam e abusam disso para justificar poderes e fenômenos em suas histórias de super-heróis. Entretanto, nem sempre eles acertam ou usam de forma correta. E como, de cada 5 filmes do cinema, atualmente 3 são da Marvel, acredito que a responsabilidade na disseminação do que é ciência e do que é ficção, fica um pouco a desejar neste quesito. Neste texto, vou me concentrar no filme Homem Formiga e no tratamento das teorias físicas dadas pelo filme.
Homem Formiga conta a história de Scott Lang (interpretado pelo carismático Paul Rudd), um ex-presidiário acusado de hackear a conta bancária do seu chefe. Scott sai da prisão sem perspectivas de conseguir um trabalho, por isso acaba aceitando a proposta do seu amigo Luís (Michael Peña)de invadir a casa de um milionário. O roubo na casa do ricaço excêntrico acaba juntando o destino de Scott com o do cientista Hank Pym (Michael Douglas) que também foi no passado um Homem Formiga.
Não vou entrar no mérito de roteiro da história propriamente dito, porque não acho que valha o texto. Meu destaque aqui é a repetição da palavra “quântico”, tanto no primeiro quanto no segundo filme. “Vocês colocam a palavra quântico no final de tudo?” Scott ironiza com o cientista Golias (Interpretado por
Mas, o que significa exatamente algo ser quântico? O que, afinal, é física quântica?
Importante salientar que a ciência é a forma humana de tentar compreender a natureza. A natureza possui incontáveis fenômenos, então nós dividimos a ciência em subáreas do conhecimento, entre elas, a física quântica. A física sofreu uma grande reviravolta na segunda metade da década de 1920 com a formulação da Mecânica Quântica. O efeito fotoelétrico e os ‘pacotinhos’ de energia chamado de quantum deram início a tentativa de entender a matéria no seu estado mais elementar. Ao contrário da física clássica, a física quântica é muito pouco intuitiva e muito paradoxal. Alguns fenômenos são estranhos o suficiente para dar vazão ao esoterismo - e o cinema adora preencher essas lacunas com uma boa ficção.
O acesso ao “reino quântico” no primeiro filme fez com que o público entrasse em contato com uma nova potencial dimensão. Doutor Estranho já vinha misturando muito do misticismo religioso com a física moderna. E o Homem Formiga usa a mecânica quântica como justificativa para mudar a realidade dos personagens. Exemplo disso é a dificuldade para localizar a mãe da Hope (Evangeline Lilly) já que em escala quântica não podemos ter a posição exata de uma partícula. Apesar de ser apresentado como um mundo paralelo ou um reino desconhecido, o “mundo quântico” é literalmente o nosso mundo e não, não podemos modificar toda a realidade mexendo em algumas peças do quebra-cabeça da matéria.
E de onde veio tudo isso? Essa confusão pode ter sido iniciada pelo bendito gato de Schrödinger. Esse experimento mental tenta expor um dos maiores paradoxos da mecânica quântica: Determinar a posição e a velocidade de uma partícula ao mesmo tempo. Basicamente o problema está em como nós medimos as coisas no geral. Para que você consiga ver algum objeto, é necessário que a luz bata no tal objeto e viaje até seu olho com informações de cor - espectro de luz - e forma etc. Claro que um raio de luz interagindo com uma cadeira não vai ter relevância na posição da cadeira, que é um objeto de massa considerável. Mas se você for tentar observar um elétron, para conseguir vê-lo precisará que fótons interajam com ele e viagem até seu olho.
Quando isso ocorrer, o fóton - que é uma partícula tanto quanto o elétron - vai acabar modificando sua posição. De modo que, toda vez que nós tentamos observar uma partícula, modificamos o estado dela. Uma partícula quântica pode e vai ocupar vários estados até o momento em que for medida, e após sua medição ela existirá em apenas um estado. O problema disso ser usado em situações em que a física clássica se aplica, é que nos dá a falsa impressão de que podemos transformar a realidade milagrosamente, o que não é o caso.
Outra questão é a garota em Fase - Fantasma - que é capaz de desorganizar e reorganizar as moléculas do seu corpo e o entrelaçamento quântico entre Scott e a mãe da Hope. Esses dois fenômenos só acontecem em condições muito controladas em laboratório e seriam impossíveis de ocorrer em nível macroscópico como acontecem no filme. Sem querer censurar nenhuma licença poética dos roteiristas da história, mas, a Marvel tem um costume de abordar teorias científicas de um jeito bastante confuso.
Me preocupa que filmes de heróis como estes são o primeiro contato que muitas pessoas têm do que é ciência - principalmente o público jovem. Mas, assim como o eletromagnetismo no século XVI, a relatividade no início do século XX, a mecânica quântica ainda vai causar muito estranhamento.
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